Muito tenho sido questionado sobre a relação Lei e Graça em nossos grupos de bate-papo e debate. Hoje o meu desejo é fazer um pouco de ordem neste assunto. Em primeiro lugar quero deixar claro que não sou legalista, um cumpridor assíduo das normas rabínica da Torah. Mas também não sou um legalista da Graça, alguém que utiliza este termo para cancelar tudo que é de bom para o nosso aperfeiçoamento, que está descrito na Torah, a lei mosaica. Creio piamente que devemos buscar o caminho real conforme dizemos em Hebraico, um caminho mais excelente, que representa aquilo que o Mestre Yeshua nos ensinou, o cumprimento da LEI através da fé, da graça e da misericórdia.
A interpretação da relação entre o ensinamento de Jesus e a Lei do Antigo Testamento é um tema complexo e debatido entre estudiosos religiosos e teólogos. De acordo com os evangelhos do Novo Testamento, Jesus frequentemente abordou questões relacionadas à lei judaica, mas sua abordagem não é uniforme e pode ser interpretada de diferentes maneiras.
Em Mateus 5:17-18, por exemplo, Jesus diz: “Não penseis que vim revogar a Lei ou os Profetas; não vim para revogar, vim para cumprir. Porque em verdade vos digo: até que o céu e a terra passem, nem um jota(Yod) ou um til(Nikud) jamais passará da Lei, até que tudo se cumpra.” Essa passagem pode ser entendida como Jesus afirmando a importância contínua da Lei do Antigo Testamento.
No entanto, Jesus também fez algumas declarações que parecem desafiar diretamente certos aspectos da Lei existente. Ele frequentemente criticava a abordagem legalista dos líderes religiosos de sua época e enfatizava os princípios mais profundos por trás da lei, como o amor a Deus e ao próximo. Por exemplo, em Mateus 5:38-39, ele diz: “Ouvistes o que foi dito: Olho por olho, dente por dente. Eu, porém, vos digo: Não resistais ao perverso; mas, a qualquer que te ferir na face direita, oferece-lhe também a outra.”
Portanto, enquanto Jesus não necessariamente aboliu a Lei do Antigo Testamento, sua interpretação e ensinamentos frequentemente aprofundavam o significado espiritual por trás da lei, colocando ênfase nas atitudes do coração e no amor, em vez de apenas nas práticas externas. Alguns argumentam que ele trouxe um cumprimento espiritual da lei, centrado em si mesmo como o Messias, e que certos aspectos da lei cerimonial e ritual poderiam ser vistos à luz desse cumprimento. Em última análise, a interpretação desse tópico varia entre diferentes tradições e estudiosos religiosos.
Vejamos mais alguns exemplos de como Yeshua não somente cumpriu a Lei, mas exige mais daqueles que o seguem do que uma postura legalista do cumprimento da lei.
Aqui estão mais alguns exemplos das interações de Jesus com a Lei do Antigo Testamento:
- Divórcio: Em Mateus 19:3-9, os fariseus questionaram Jesus sobre o divórcio, que era permitido pela Lei de Moisés. Jesus respondeu reafirmando a criação do casamento como uma união indissolúvel e disse: “Portanto, o que Deus uniu, não o separe o homem.”
- Sábado: Jesus frequentemente realizava curas milagrosas no sábado, o dia de descanso segundo a Lei. Isso causava controvérsias com os líderes religiosos. Ele argumentava que o sábado foi feito para o homem, e não o contrário (Marcos 2:27), sugerindo que o amor e a compaixão eram mais importantes do que a observância rígida do sábado.
- Lavagem de mãos: Em Marcos 7:1-23, Jesus confronta os fariseus sobre suas tradições de lavagem de mãos e sua ênfase na pureza ritual. Ele argumenta que o que realmente contamina uma pessoa não é o que entra pela boca, mas sim o que sai do coração, destacando a importância do coração e das intenções.
- Lei do Amor: Em Mateus 22:34-40, Jesus resume os mandamentos da Lei ao dizer que o maior é amar a Deus de todo o coração e amar o próximo como a si mesmo. Ele afirma que todos os mandamentos dependem desses dois princípios.
- Adúltera e apedrejamento: Em João 8:1-11, os escribas e fariseus trouxeram uma mulher a Jesus que tinha sido pega em adultério, citando a Lei de Moisés que prescrevia o apedrejamento. Jesus respondeu desafiando quem estivesse sem pecado a atirar a primeira pedra, destacando a misericórdia sobre o julgamento.
- Sacrifícios e misericórdia: Jesus enfatizava a importância da misericórdia sobre os rituais de sacrifício. Em Mateus 9:13, ele disse: “Ide, porém, e aprendei o que significa: Misericórdia quero, e não sacrifícios.” Isso refletia a ideia de que a atitude do coração e a compaixão eram mais cruciais do que meros rituais.
- Reino de Deus: Jesus frequentemente falava sobre o Reino de Deus, que era uma realização mais profunda das promessas do Antigo Testamento. Seus ensinamentos indicavam que ele estava trazendo uma nova fase na história da salvação, transcendendo algumas das formas mais estritas da antiga Lei.
Estes são apenas alguns exemplos que ilustram a complexa abordagem de Jesus em relação à Lei do Antigo Testamento. Suas ações e palavras muitas vezes desafiavam os entendimentos convencionais da época, enfatizando valores mais profundos e espirituais sobre o cumprimento literal da lei.
O cumprimento da Lei pela fé, por meio da graça
O cumprimento da Lei pela fé, por meio da graça, em contraposição ao legalismo, é um princípio central nas doutrinas cristãs do Novo Testamento. Isso reflete a maneira como os ensinamentos de Jesus e a compreensão do evangelho influenciam a relação entre os crentes e a Lei do Antigo Testamento.
- Pela Fé: A ênfase está na fé em Jesus Cristo como Salvador e Senhor. Em vez de depender da própria capacidade de cumprir rigidamente os mandamentos da Lei, os cristãos são chamados a confiar na obra redentora de Jesus na cruz e na sua ressurreição. A fé é vista como a chave para a reconciliação com Deus e a vida eterna.
- Por Meio da Graça: A graça é o presente imerecido de Deus para a humanidade. Os cristãos acreditam que a salvação não é alcançada pelas boas obras ou pelo estrito cumprimento da Lei, mas é um dom gratuito concedido por Deus através de Seu amor e misericórdia. Isso liberta os crentes da necessidade de se esforçar para merecer a salvação.
- Não pelo Legalismo: O legalismo refere-se a uma abordagem rigorosa e externa à observância da lei religiosa. Jesus criticou os líderes religiosos de sua época por se concentrarem excessivamente em regras e regulamentos, enquanto negligenciavam o amor, a misericórdia e a justiça. O legalismo pode levar a uma mentalidade de autossuficiência e arrogância espiritual.
- Transformação Interna: Em vez de enfatizar apenas a observância externa da Lei, o cristianismo enfoca a transformação interna do coração e da mente. Os ensinamentos de Jesus convidam os crentes a amar a Deus e ao próximo de maneira genuína e a demonstrar isso através de suas ações e atitudes.
- Nova Aliança: O Novo Testamento apresenta a ideia de uma Nova Aliança, na qual a relação entre Deus e a humanidade é fundamentada no sacrifício de Jesus e no dom do Espírito Santo. Isso significa que os crentes não estão mais sob o jugo da Lei como era no Antigo Testamento, mas estão ligados a Deus através da fé em Cristo.
- Fé Ativa: Embora a graça seja um dom gratuito, a fé genuína se manifesta em boas obras e obediência aos ensinamentos de Jesus. Os crentes são encorajados a viver uma vida de amor, serviço e justiça como resposta à graça que receberam.
Em resumo, o cumprimento da Lei pela fé, por meio da graça, não se trata de abandonar a importância dos princípios éticos e morais encontrados na Lei do Antigo Testamento, mas de entender que a salvação e a relação com Deus são estabelecidas pela fé em Cristo e pela graça de Deus, em vez de depender apenas do legalismo e do rigor externo.
A importância de praticar os mandamentos nos evangelhos
Nos evangelhos do Novo Testamento, Jesus enfatiza repetidamente a importância de praticar os mandamentos, mas ele o faz dentro de um contexto mais profundo do amor e da transformação interior. Aqui estão algumas maneiras pelas quais os evangelhos destacam essa importância:
- Obediência como Sinal de Amor: Jesus conecta a obediência aos mandamentos com o amor por Deus e pelos outros. Em João 14:15, ele diz: “Se me amais, guardareis os meus mandamentos.” O ato de obedecer é visto como uma expressão concreta do amor e da devoção a Deus.
- Crescimento Espiritual: A prática dos mandamentos é vista como uma maneira de crescer espiritualmente e se tornar mais semelhante a Deus. Jesus instrui seus seguidores a serem “perfeitos como o Pai celestial é perfeito” (Mateus 5:48), apontando para um padrão elevado de vida moral.
- Testemunho para o Mundo: A prática dos mandamentos é uma forma de testemunhar a fé aos outros. Em Mateus 5:16, Jesus diz: “Assim brilhe também a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem o vosso Pai que está nos céus.” O comportamento ético dos crentes chama a atenção para Deus.
- Transformação do Coração: Jesus enfatiza que a verdadeira observância dos mandamentos vai além das ações externas e alcança o coração. Ele critica aqueles que praticam a justiça apenas superficialmente, sem uma mudança interna (Mateus 23:23-28). A obediência deve ser acompanhada por um coração sincero.
- Fuga do Legalismo: Enquanto Jesus enfatiza a importância da obediência, ele também alerta contra o legalismo vazio. Ele repreende os fariseus por se concentrarem em detalhes externos enquanto negligenciam os princípios mais profundos (Mateus 23:23). O objetivo é uma obediência motivada pelo amor e pelo entendimento.
- Fundamento da Vida Cristã: Jesus resume os mandamentos em dois grandes princípios: amar a Deus de todo o coração e amar o próximo como a si mesmo (Mateus 22:37-40). Ele diz que “destes dois mandamentos dependem toda a Lei e os Profetas.” Esses princípios servem de base para a vida cristã.
- Relação com Deus: Obedecer aos mandamentos é uma forma de manter e fortalecer a relação com Deus. Jesus compara essa relação à videira e aos ramos, afirmando que permanecer nEle é essencial para dar frutos espirituais (João 15:1-11).
Em suma, nos evangelhos, Jesus não apenas enfatiza a importância de praticar os mandamentos, mas também ensina a perspectiva mais profunda por trás dessa prática: uma relação transformadora com Deus, a expressão do amor e a busca pela santidade interior.
Portanto, se Yeshua nos ensinou que devemos praticar a lei de uma forma ainda mais profunda, não podemos pensar jamais que isso significa cancelar ou desprezar sua importância, muito pelo contrário. Ele afirmou:
Aquele que tem os meus mandamentos e os guarda, esse é o que me ama; e aquele que me ama será amado de meu Pai, e eu o amarei, e me manifestarei a ele. João 14:21
Os mandamentos, mitzvot, de Yeshua não são somente aqueles que queremos escolher como os dízimos, não mentir, não roubar. Ele inclui a guarda do Shabat, a misericórdia para com os necessitados. Incluir pregar o evangelho, alimentar os pobres, visitar as viúvas, os órfãos, os presos, adotar os outros se necessário. Enfim, Yeshua não tinha onde recostar a cabeça, ELE nos deu o exemplo de que mais importante do que ter um lugar para chamar de casa, uma pessoa para chamar de esposa, um buraco para chamar de túmulo, era amar e demonstrar amor as pessoas. Ele não estava interessado em um Templo, não em um Palácio, não em Casas de Banho, o clube da antiguidade. Ele estava interessado em curar, salvar e resgatar almas para o PAI. E este de fato dever ser o foco de nossas vidas. Portanto, devemos tirar o foco na preocupação de onde investir para ter mais, o que comprar, o que construir, e focar em onde o PAI nos conduzirá a servir ao Reino Eterno de maneira mais profunda e glorificadora daquele que quer nos dar a Vida Eterna.
Shabbat Shalom,
Miguel Nicolaevsky