O Poder da Redenção – 1 parte

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Muito já se tem falado sobre a salvação, principalmente por que como seres humanos, nosso desejo é assegurar o nosso futuro, porém, nos parece que o presente, cuidamos nós mesmos, ou simplesmente nos acomodamos com aquilo que somos e como vivemos.

Meu desejo aqui neste artigo, é trazer aqui uma reflexão sobre mais profunda de algo que pouco de nós, parar para pensar, questionar, e até mesmo entender a sua grandeza, e a forma com que isto está a nossa volta e pode transformar nossa maneira de pensar, vamos nos concentrar hoje, no poder da redenção.

A expressão redenção aparece na Bíblia Hebraica(VT), 14 vezes, em 13 versículos.

Lev. 25:24, Lev. 25:26, Lev. 25:29, Lev. 25:31, Lev. 25:48, Lev. 25:51, Jer. 32:7, Ezeq. 11:15, Rute 4:6.

Todas estas referências sobre a palavra redenção, Geula – גאולה em Hebraico, estão associadas de uma forma ou de outra, a possessão de algum bem, o mais comum, é de uma área agrícola, o direito a terra, a herança. Este direito era preservado pela lei da Torah e passava entre os membros da família, era concedido normalmente pelo Pai e para os Filhos. Apesar de ser uma lei basicamente social, era de extrema importância, pois dela dependia não somente o direito, mas também a sobrevivência de uma família, bem como demonstrava a hierarquia da mesma.

Apesar de sua importância, a Bíblia somente cita duas importantes referências a mudança da redenção por parte de um segundo redentor, ou seja, aquele que redimiria a herança e o direito a terra caso o primeiro estivesse impedido disso. Mas será que a redenção é somente isso ou está relacionada a algo muito mais profundo e reflete algo muito mais espiritual do que a redenção física?

Bem, acredito que a chave para isso pode estar em outras pistas que a Bíblia Hebraica nos dá no contexto das referências trazidas aqui. Em Jer. 32:7 a Geula está ligada a Yerusha, ou seja, a Herança. Quando uma ocorre, a outra também acontece, veja a seguir:

Eis que Hanameel, filho de Salum, teu tio, virá a ti dizendo: Compra para ti a minha herdade(campo) que está em Anatote, pois tens o direito de resgate(redimí-la, Geula) para comprá-la.
Veio, pois, a mim Hanameel, filho de meu tio, segundo a palavra do Senhor, ao pátio da guarda, e me disse: Compra agora a minha herdade(herança, Yerusha) que está em Anatote, na terra de Benjamim; porque teu é o direito de herança(Yerusha), e tens o resgate(Geula); compra-a para ti. Então entendi que isto era a palavra do Senhor. Jeremias 32:7,8

Aqui podemos ver claramente como estas duas expressões estão intimamente ligadas, e para o antigo Hebreu, morador de Judá ou de Israel, uma ação não existia sem a outra. Não há herança sem a redenção da terra, e não há redenção sem herança ou se preferir, herdade.

No livro de Rute 4:6, o mesmo sentido de redenção está associado a uma herança, até por que o outro redentor não quis redimir, para não ter que se desfazer de seu campo. A lei da redenção não se aplicava somente a posse da terra, mas estava acima de tudo ligada ao pacto nupcial que deveria ser feito entre o redentor e a viúva, que deveria, se o mesmo concordasse, se casar com ela para suscitar a herança e a continuidade daquele marido que havia morrido.

Em Gen. 38:8, Onan, um israelita que estava sob a mesma lei e deveria redimir a semente de seu irmão, se casando e tendo filhos com a viúva dele, se recusou a cumprir o mandamento. O pecado de Onan não foi somente não querer ter filhos com a mesma, mas sim querer desfrutar dos benefícios da redenção, o casamento, a mulher, a herança, a posse da terra, mas não cumprir a sua parte na lei, que era trazer descendentes ao seu irmão, então por isso, ele foi severamente punido, e morreu.

Os textos que citamos aqui demonstram que a redenção era muito mais do que um ato social, material ou uma questão judicial da antiguidade, ele tinha um valor espiritual que ia além de nossa compreensão, e creio que ele está ligado a restauração, a renovação e a ressureição. De fato, a redenção é a forma pela qual, a lei da Torah garante a continuidade da posse da terra, visto que no posse da mesma, representava o favorecimento divino ao seu povo, e isso podemos aprender:

Também a terra não se venderá em perpetuidade, porque a terra é minha; pois vós sois estrangeiros e peregrinos comigo.
Portanto em toda a terra da vossa possessão dareis resgate à terra.
Quando teu irmão empobrecer e vender alguma parte da sua possessão, então virá o seu resgatador, seu parente, e resgatará o que vendeu seu irmão. E se alguém não tiver resgatador, porém conseguir o suficiente para o seu resgate, Então contará os anos desde a sua venda, e o que ficar restituirá ao homem a quem a vendeu, e tornará à sua possessão. Levítico 25:23-27

Note que nos versículos acima, podemos aprender que de fato, a posse da terra, segundo o mandamento da redenção, não é dos seus moradores, mas sim do próprio Deus que os permite administrar o seu bem. É por isso que a redenção é algo tão importante, a tal ponto, que mesmo perdendo o direito, o herdeiro pode de alguma forma resgatá-lo, seja através da compra, ou pelo vencimento por conta do jubileu(50 anos). Sendo assim a terra em que vivemos, o planeta inteiro, não é nosso de forma absoluta, mas sim uma espécie de arrendamento de terras, cujo dono sobre tudo, é Adonai.

Deus Criador e Formador

Em diversos aspectos, Israel é o microcosmos que reflete o que se passa em todo Mundo, talvez, em todo o Universo. O que acontece ao longo da história de Israel é um espelho do que acontece com o Mundo inteiro.

Os hebreus já estão no terceiro período contínuo de sua história, em seu primeiro período, eles conquistaram a Terra Prometida sob o comando de Josué por volta de 1250 AC, mas a plenitude de seu território somente foi alcançada no final do reino de Davi. Esta era terminou com a destruição de Jerusalém em 586 AC pelos babilônicos. O primeiro período foi de 664 anos.

No segundo período continuo da história dos Hebreus, cerca de 70 depois que eles foram levados para o cativeiro, começaram a retornar, e a reconstruir sua presença novamente em sua terra. Esta presença que começou a se estabelecer desde o decreto de Ciro o Grande em 539 AC, levou a restauração não somente do povo, mas também a renovação e redenção da terra através de sua posse. Israel experimentou um longo período de renovação e nos últimos 100 anos começou a cair novamente em declínio, bem como na fase anterior, isso levou ao longo cativeiro que teve seu início no ano 70 da EC. O segundo período foram de 609 anos.

Cerda de 2000 anos os judeus ficaram longe de sua terra, e ao longo da história, é verdade que algumas família conseguiram resistir e permanecer no país, se adaptando e se escondendo, mas a grande maioria foi privada da posse e da herança de sua terra. Em meados do século VIX, quando os judeus investiram em suas primeiras ondas de imigração, eles tiveram que comprar novamente o direito a terra, mas muitos outros já haviam se apossado dela. Durante o final do século XIX e começo do século XX, a palavra redenção e a expressão redimir a terra, estava praticamente na boca de cada judeu que pisava na Terra Santa, pois é exatamente isso que almejam, a restauração de sua herança material e espiritual.

Do Caos – Tohu vaVohu para a Redenção – Geula

A verdade é que em termos espirituais, a ausência de uma herança e da posse da terra, para o povo de Israel, isto demonstra o Caos. Este caos é revelado em Gen 1:2, onde a terra era sem forma e vazia, ou seja, não haviam seres humanos para a governar, nem mesmo o Sol e a Lua governavam o dia ou a noite.

O mesmo caos é revelado quando os israelitas estão no Egito, quando o governo de opressão de Faraó está sobre eles, além disso, eles não tinham posse alguma no Egito, pois conforme no livro de Gênesis está descrito, todas as terras pertenciam a ele. Mesmo dentro do caos do cativeiro no Egito, Adonai estava preparando seu povo para redimir a sua terra, a chamada terra de Canaã, e por este motivo o multiplicou, pois era necessário que ao chegar nela, eles habitassem em todo o país.

A redenção não é somente o ato de comprar, adquirir ou casar com quem tem o direito a posse como no caso de Rute a moabita, mas principalmente a ação de habitar no local, viver nela, restaurá-la através do plantio, da guarda e da construção de residências, caso contrário, se tornará local de habitação para os chacais, as feras do campo, e perderá o seu valor real.

É interessante notar, que mesmo havendo caos, tanto em Gen. 1 quanto em Ex. 1, a ação divina para mudar esta situação estava acontecendo por detrás dos bastidores. Esta ação é descrita em Gen. 1:2 como o “Espírito que Paira sobre a Face das Águas”, e em Ex. 1 a benção da multiplicação e frutificação dos hebreus, que culminou em Ex. 2 com o nascimento de Moisés, a figura que é mais identificada na Torah com o papel do redentor, aquele que leva o povo de Israel de volta, rumo a terra para reconquistar sua posse.

Criar versus Formar

Para entendermos melhor o significado da Redenção, meu desejo é partimos para um compreensão ainda mais profunda da essência desta palavra. Analisemos juntos, e o primeiro herdeiro de uma terra ou o primeiro marido de uma mulher representam o primeiro estágio na vida social comum entre os hebreus que viveram em Israel a 2.000 anos atrás, a redenção representa o segundo estágio, um estágio mais avançado, mais social, mas justo e mais perfeito.

Ninguém redimiria uma terra e com ele um casamento e resgataria uma viúva do abandono e falta de expectativa de sobrevivência da mesma se não fosse por amor, ou por interesse. Conforme lemos no livro de Rute, o primeiro na fila dos redentores, que não quiz redimir a mulher moabita, não o fez por diversos motivos, entre eles, não queria perder parte do seu terreno para seus irmãos, e provavelmente já era casado, sendo assim, não poderia ter como herdade, três possessões completas, o que causaria uma injustiça social com outros que não teriam praticamente nada.

Não sabemos o que aconteceu de fato com a possessão de Boaz, pois o texto não fala, mas com certeza não deve ter perdido a mesma, e o motivo para isso deve ser por que ele não era casado ainda, a lei permitira a ele, manter sua posse e agregar a de Rute. Além disso, o texto nos deixa claro que o que realmente uniu Boaz a Rute foi o seu amor, sua admiração por uma mulher valorosa, que mesmo sendo viúva, conquistou seu coração.

O redentor é alguém que está disposto a correr riscos, a perder sua própria herança ou herdade em prol de uma mulher amada, mesmo ele sendo viúva. O novo casamento, o fruto de uma redenção, é visto na Bíblia como algo fora do comum, a tal ponto que as bençãos concedidas ao novo casal, são descritas como as mesmas bençãos concedidas ao patriarcas e suas esposas, os pais da fé judaica, conforme podemos ler a seguir:

E todo o povo que estava na porta, e os anciãos, disseram: Somos testemunhas; o Senhor faça a esta mulher, que entra na tua casa, como a Raquel e como a Lia, que ambas edificaram a casa de Israel; e porta-te valorosamente em Efrata, e faze-te nome afamado em Belém. Rute 4:11

Ou seja, diante destas conclusões maravilhosas, podemos entender que a criação, neste caso de um casamento, ou uma família é algo louvável, porém a redenção através da formação de uma nova família que vem restaurar a primeira após a perda do marido, é algo muito superior, algo verdadeiramente divino.

No Livro de Gênesis Capítulo 1, o autor, provavelmente Moisés, utiliza o verbo Bara (ברא) para falar sobre a criação na primeira descrição. Este capítulo dá-nos um panorama inicial sobre as primeiras gerações onde o processo criativo de Deus se manifestou. Quando a Terra começa a sair do caos para a ordem, o verbo utilizado não é criar, mas sim dizer, pois através da palavra Adonai cria todas as coisas. Ao final deste capítulo o Senhor ordena aos seres humanos dominar el se multiplicar sobre a terra. Eles foram criados segundo a imagem e semelhança do Criador.

No segundo relato em Gênesis 2, a palavra utilizada para quando Adonai cria o Homem é a palavra hebraica Yatzar, ou seja, formou. O homem não é então ordenado a dominar, ele é posto no jardim para cuidá-lo. Tudo indica que a diferença na narrativa foi feita para demonstrar que o primeiro relato se trata de uma criação em um processo de consequências, ou seja, uma coisa que vai levando a outra, Adonai permite este processo afim de posteriormente dar ordem e forma em sua criação.

No segundo relato, Adonai dá forma, ele utiliza materiais que vieram a existência em sua primeira criação, então planta um jardim, e põe nele o Homem e a Mulher, agora formados segundo a sua imagem e semelhança para lavrá-lo e guardá-lo. Isto demonstra-nos que o segundo propósito para a humanidade era superior ao primeiro, e é neste cenário que ocorre a cena mais decisiva da humanidade. O uso de Bara(ברא) e Yatzar(יצר) para criar de formas diferentes, em alguns casos traduzido por criar e forma, demonstra a difere não somente do uso de materiais, mas também da intenção que está pode detrás destas ações. Vejamos a seguir:

Para que se saiba desde o nascente do sol, e desde o poente, que fora de mim não há outro; eu sou o Senhor, e não há outro.
Eu formo a luz, e crio as trevas; eu faço a paz, e crio o mal; eu, o Senhor, faço todas estas coisas. Isaías 45:6,7

Este texto é muito interessante, pois o profeta Isaías fez uma diferenciação entre criação e criação. para a LUZ, algo que sabemos ser bom e que existe de fato, ele usa o termo Formar(Yatzar), assim como a descrição da ofrmação do homem no capítulo 2 de Gênesis. as trevas e o mal, o profeta usa o termo Criar(Bara), que no Gênesis é utilizado para o primeiro relato da criação, menos definido e mais associado a uma criação consecutiva e manos a uma ordem e intervenção direta em sua formação. Esta diferenciação proposta por Isaías pode ser a chave para entendermos o princípio da redenção e da ação do redentor.

Na criação, as consequências podem ser más e boas, na redenção, o objetivo final é a restauração. Aquele mundo criado por Deus e as primeiras gerações da humanidade até Noé, foram dizimados como consequência de seus pecados. A nova humanidade, segundo a aliança de Noé, tem como finalidade a restauração e não mais uma auto-destruição desenfreada como a que aconteceu no dilúvio.

O Redentor não veio para aquela primeira era da criação, mas para a segunda era. Seu objetivo é se manifestar ao Mundo afim de preparar os que creem para uma nova era, superior a atual, onde os que estarão debaixo do novo pacto da redenção, desfrutem de um mundo novo, exatamente como Rute desfrutou de um novo casamento, uma nova família e uma nova geração em um país completamente novo. Então qual será mesmo o verdadeiro poder da redenção? Como poderemos entender a sua manifestação, estas perguntas estarei respondendo no próximo estudo, O Poder da Redenção – 2 parte.

Desde Sião,

Miguel Nicolaevsky

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