Quem diria que o destino dos europeus estaria nas mãos dos judeus em menos de 100 anos?
Decisão de Berlim sobre embargo militar a Israel expõe dependência estratégica e abala décadas de política externa
BERLIM — Menos de um século após o Holocausto, a Alemanha se vê em meio a uma crise política e diplomática que expõe o quanto sua segurança ainda depende de Israel. Na sexta-feira (8), o chanceler Friedrich Merz anunciou a suspensão, até nova ordem, de todas as exportações militares que possam ser utilizadas na Faixa de Gaza.
A medida foi tomada poucas horas após o gabinete de segurança de Israel aprovar o plano do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu para a ocupação de Gaza. Apesar de reafirmar o direito de Israel à autodefesa contra o Hamas, Merz disse estar “profundamente preocupado” com o impacto humanitário sobre civis palestinos e afirmou que a ocupação dificulta a libertação de reféns e o desarmamento do grupo.
A Alemanha, um dos principais fornecedores de armamento a Israel na Europa, aprovou licenças de exportação que somam cerca de 485 milhões de euros desde outubro de 2023. O embargo representa uma ruptura com décadas de apoio quase incondicional ao Estado judeu.
A decisão provocou reação imediata em Jerusalém. Netanyahu acusou Merz de “premiar o terrorismo” e expressou “profunda decepção” com a mudança de postura alemã. Em Berlim, o anúncio acendeu divisões na base conservadora da CDU/CSU, com parlamentares e ex-ministros classificando a medida como “um erro estratégico com consequências graves”.
Além da tensão política, a medida levanta uma questão incômoda: a Alemanha possui contratos ativos com empresas israelenses, incluindo a compra de sistemas de defesa antimísseis da Elbit no valor de US$ 260 milhões. Caso Israel reaja restringindo suas próprias exportações, especialistas alertam que o sistema de segurança aérea da Alemanha poderá ser comprometido.
Em meio a pressões internas e externas, Merz reiterou que as negociações por cessar-fogo e libertação de reféns seguem como prioridade máxima, e pediu que Israel “não avance para a anexação da Cisjordânia”. Entretanto, a crise revela uma realidade inesperada: na balança da segurança europeia, Israel detém um peso que poucos imaginavam que teria tão cedo.
Linha do Tempo – Da reconstrução pós-Holocausto à dependência estratégica da Europa em relação a Israel
1945 – Fim da Segunda Guerra Mundial e do Holocausto
- Europa devastada e moralmente marcada pelo genocídio de seis milhões de judeus.
- O trauma coletivo cria um compromisso moral de apoiar a sobrevivência e segurança do povo judeu.
1947–1948 – Criação do Estado de Israel
- A ONU aprova o Plano de Partilha e, em 14 de maio de 1948, David Ben-Gurion proclama a independência de Israel.
- Muitos países europeus, ainda hesitantes, reconhecem Israel, em parte como reparação histórica.
Década de 1950 – Primeiras cooperações estratégicas
- França e Reino Unido vendem armamentos e ajudam no desenvolvimento inicial das Forças Armadas de Israel.
- Europa vê Israel como aliado militar contra a influência soviética no Oriente Médio.
1967 – Guerra dos Seis Dias
- Vitória relâmpago de Israel aumenta seu prestígio militar.
- Interesse europeu cresce em aprender táticas e tecnologias militares israelenses.
Década de 1970 – Embargos árabes e crise do petróleo
- Países árabes pressionam Europa a cortar laços militares com Israel, mas a cooperação secreta continua.
- Início do intercâmbio de inteligência antiterrorista entre Israel e países europeus, após atentados como o de Munique (1972).
1980–1990 – Especialização tecnológica
- Israel desenvolve sistemas avançados de vigilância, drones e cibersegurança.
- Países europeus começam a importar tecnologia israelense para defesa e controle de fronteiras.
2000–2010 – Guerra ao Terror e aumento da cooperação
- Atentados de 11 de setembro e ataques em Madri (2004) e Londres (2005) ampliam a parceria.
- Israel se torna fornecedor-chave de sistemas de segurança urbana, aeroportuária e cibernética.
2011–2015 – Instabilidade no Oriente Médio
- Primavera Árabe, guerra civil na Síria e avanço do ISIS aumentam a importância de Israel como posto avançado de inteligência para Europa e OTAN.
2020–2023 – Conflitos regionais e exportações estratégicas
- Sistemas como o Domo de Ferro e mísseis interceptores passam a ser adquiridos por países europeus.
- Israel fornece drones, radares e softwares para defesa aérea e monitoramento de ameaças.
2024–2025 – Dependência declarada
- Contratos bilionários para fornecimento de sistemas antimísseis israelenses à Alemanha e outros países da OTAN.
- Em meio à guerra em Gaza, chanceler Friedrich Merz suspende envio de armas a Israel, mas especialistas alertam: Se Israel retaliar limitando exportações militares, a defesa aérea da Alemanha ficará comprometida, por consequência, de toda a Europa.
📌 Conclusão da Linha do Tempo
Em menos de 80 anos, a Europa passou de protetora moral de Israel para dependente estratégica dele. A inversão revela não só o avanço tecnológico israelense, mas também o esvaziamento da capacidade europeia de manter sua segurança sem o know-how militar e de inteligência do Estado judeu.
Desde Sião, Miguel Nicolaevsky
Fontes:
- DW – Germany suspends arms exports to Israel for use in Gaza
- The Guardian – Germany halts military exports to Israel over Gaza offensive
- Politico – Germany halts Gaza-related arms exports to Israel
- Reuters – Gaza faces starvation, reluctant Germany starts to curb support for Israel
- Bild – Netanyahu: Arms embargo rewards Hamas